Largada de Bottas foi demonstração de reflexo ou uma sorte desgraçada, mas valeu

Por Daniel Médici

Valtteri Bottas conquistou sua segunda vitória na carreira, na Áustria, em uma performance inconteste, com pole position e defesa direta de posição com Sebastian Vettel. Mas que será sempre lembrada pela suspeita de queima de largada.

Entre demonstração de reflexo e uma sorte desgraçada, a largada do finlandês da Mercedes foi, provavelmente, ambas as coisas. Mas foi válida —e seu debate evidencia a própria dificuldade que temos em determinar conceitos que damos como óbvios.

A diferença entre acelerar antes ou não do apagar das luzes é um exemplo disso. Tanto que a justificativa oficial da FIA para não punir Bottas foi a de que o movimento do carro estava “dentro da tolerância permitida” pelas regras. Em outras palavras, sim, o carro se moveu antes da largada, mas não, não configura queima.

Num carro de F-1, as especificidades da transmissão fazem com que acionar a embreagem para passar do neutro à primeira marcha seja suficiente para que o conjunto se mova alguns centímetros para a frente. Isso era mais fácil de se ver até o início dos anos 90, na época das alavancas de câmbio. Também era uma época em que não existia monitoramento eletrônico de largada, e os comissários tinham muito mais trabalho em punir os apressadinhos.

Por isso, até 1995, a regra dizia que só se podia considerar uma queima de largada se as rodas dessem um giro completo antes do sinal verde aparecer. O carro podia até largar em movimento, mas havia um limite para o tolerável. Além disso, o tempo entre o acender da luz vermelha e o da verde era aleatório, definido pelo starter (se o nome Derek Ongaro veio à sua cabeça, cuidado: pode ser indicativo de idade avançada).

Isso mudou no GP Brasil de 1995, quando, em caráter de teste, foi implantado o monitoramento eletrônico de queimas de largada. Na etapa espanhola do mesmo ano, a novidade foi adotada de forma definitiva. “Colocados no asfalto, na posição de largada de cada carro, detectam, através de ondas de rádio, e da variação da sua potência, se o carro se moveu antes da luz verde ter sido acesa”, diz o anuário “Fórmula 1 1995-1996” de Francisco Santos. “Qualquer movimento de um dos carros superior a 20 cm é assinalado no mapa do computador para os comissários desportivos aplicarem a pena”, completa a nota.

Acontece que a tolerância aplicada se revelou um problema. Em Silverstone, no mesmo ano, um festival de penalidades foi aplicado. E não seria o único problema com largadas a ser enfrentado.

Havia a suspeita também, de que a Benetton houvesse desenvolvido um sistema que reconhecia a luz verde e acionava um controle de tração especial para largadas. No ano seguinte, a luz verde foi extinta e o procedimento passou a contar com uma sequência de luzes vermelhas, que dão o sinal ao se apagarem. Exatamente como hoje.

No fim, após uma briga entre pilotos e a fornecedora do sistema, a Tag Heuer, chegou-se a um acordo. A tolerância para movimento antes do sinal ainda existe. Bottas não quebrou nenhuma regra, venceu e está em terceiro lugar na tabela, a 15 pontos de Lewis Hamilton, e o resto é barulho.

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