Houve um tempo em que, para ser mais rápido, o piloto precisava saber quando frear, como contornar uma curva, como acelerar antes. Precisava também de coragem para chegar ao limite do carro. Agora, a Stock Car brasileira exige mais uma habilidade para seus inscritos: o talento de implorar atenção na internet.
A novidade será implantada neste domingo (2), na Corrida do Milhão, que acontece em Curitiba. Batizado de Hero Push, em ação conjunta com uma patrocinadora, o mecanismo dá direito de um “push” a mais durante a prova para os pilotos mais votados no site oficial e no aplicativo da categoria.
Cada “push” habilita cerca de 100 hp de potência a mais por cerca de 16 segundos. Seis pilotos serão contemplados com a facilidade em Curitiba, e três nas próximas etapas do calendário. Exceto em duas provas, o benefício não poderá ser concedido consecutivamente para o mesmo piloto em etapas consecutivas.
A ideia não é original da categoria brasileira, mas cria da F-E, o mundial de carros elétricos da FIA. Chamado de FanBoost na categoria, ele também concede cerca de 40 hp a mais durante cinco segundos para os três mais votados do grid. O mais votado ganha o benefício nos dois carros usados durante cada corrida.
Em ambos os casos, embora possa ser determinante para a corrida, a vantagem extra não chega a tornar a competição assimétrica demais. Em outras palavras, a ajuda do fã é mais cosmética do que efetiva. Ainda assim, em nome da “interatividade”, há um movimento claro no automobilismo para transformar as corridas em concursos de beleza, ou reality shows, ou gincanas. O próximo passo, quem sabe, seria trocar comentaristas especializados pela narração de Celso Portiolli.
Como o próprio nome diz, no automobilismo, o carro quase sempre será mais importante que o piloto. É um esporte injusto, cruel e potencialmente perigoso. Exatamente como a vida. E por isso é que atrai o interesse de milhões de pessoas, há mais de um século. Mas reduzir pilotos a mendigos de “likes” deforma o caráter esportivo do evento.
Não é certo que as entidades esportivas fechem os olhos para as plataformas digitais, claro —vide a F-1, que demorou demais para perceber a mudança do mundo à sua volta. O problema agora é saber se a Stock Car é uma categoria que tem um site, ou se é um site que tem uma categoria.
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