Há 15 anos, Michael Schumacher vencia o GP da Áustria num autódromo lotado de fãs alemães. Era 2002, e seu pentacampeonato parecia uma questão de tempo. Mas, no lugar dos aplausos, o que se ouvia em Spielberg era uma vaia uníssona. No pódio, os pilotos da Ferrari não sabiam onde enfiar a cara. Foi um dos momentos mais constrangedores da história da F-1, por motivos óbvios.
Rubens Barrichello havia liderado a corrida inteira, impondo-se pela primeira vez no ano sobre o companheiro de Ferrari. Era apenas a sexta corrida da temporada, mas Schumacher já contava quatro vitórias. Um jogo de equipe àquela altura e naquelas condições não era justificável. Mesmo assim, a transmissão da TV não cansava de mostrar Ross Brawn, o diretor técnico, conversando no rádio com os pilotos, sob o beneplácito de Jean Todt. Os temores se confirmaram depois da última curva da última volta: Rubinho desacelerou e se conformou com o segundo lugar.
Aquela imagem se cristalizou na memória do público brasileiro. Talvez por uma razão inconsciente, até: no ano anterior, no mesmo GP da Áustria, a Ferrari havia invertido a posição de Barrichello e Schumacher, numa prévia quase fotográfica dos acontecimentos. Mas ambos estavam atrás de David Coulthard, e o jogo de equipe definiu apenas um segundo lugar.
Rubinho contava, então, com apenas um triunfo na categoria.
Quase todo mundo saiu chamuscado do episódio. A F-1, ao ser taxada como uma categoria farsesca, com mais glamour do que competição. A Ferrari e seu chefe, Jean Todt, como inimigos do esporte. Schumacher, como um piloto mimado e autocentrado. E, finalmente, Barrichello, como um piloto condenado a ser eterno coadjuvante.
Pior para Barrichello foi que aquele GP da Áustria reforçou uma impressão difusa que a opinião pública brasileira já havia construído sobre sua carreira, a de eterna promessa que nunca deslanchou. Por uma série de fatores.
Rubinho foi bem-sucedido nas categorias de base e parecia destinado a liderar a quarta geração de pilotos brasileiros campeões mundiais. Logo em sua segunda temporada de F-1, porém, viu Ayrton Senna morrer, e herdou precocemente o trono. Uma vez protagonista da torcida de um país acostumado a vencer, era natural que frustrasse as expectativas nacionais, já altíssimas.
Ainda jovem, lutou anos para se firmar em uma equipe de ponta enquanto sofria com um desempenho errático no meio do grid. A oportunidade veio, finalmente, com a Ferrari, a qual já tinha em Schumacher um líder inconteste. Na nítida posição de segundo piloto, conquistou sua primeira vitória a duras penas, em sua 124ª tentativa —um recorde negativo, só superado depois por Mark Webber. No ano seguinte, em 2001, apesar de ter o melhor carro à disposição, não repetiu o feito.
Para colocar panos quentes, a Ferrari evitou ordens polêmicas depois do fatídico GP da Áustria, e Barrichello terminou o ano com quatro vitórias. Mas o estrago já estava feito.
Todos os outros responsáveis pelo episódio, bem ou mal, se redimiram. Schumacher ganhou mais campeonatos, acumulou mais recordes e terminou a carreira respeitado. Ross Brawn foi campeão mundial até com sua própria equipe. Jean Todt é hoje o presidente da FIA, entidade máxima do esporte a motor. A F-1 e a Ferrari mantém o prestígio e um séquito de fãs.
Rubinho deixou um legado muito mais controverso. Aposentou-se da F-1 como o piloto com maior número de GPs disputados, mas nunca brigou por um título. Fez uma temporada razoável na Indy. Foi campeão na Stock Car, mas nunca se livrou da pecha que grudou nele em Spielberg, em 2002. Tem um grande número de fãs, mas muito mais detratores que Emerson, Piquet, Senna ou Felipe Massa.
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