Uma tempestade se formava em Mairiporã entre as 15h e 16h daquela sexta-feira, 18 de março de 1977, quando um monomotor Cessna explodiu ao bater contra a serra da Cantareira. Entre os três mortos, estavam o piloto de corridas Marivaldo Fernandes, dono do avião, e Carlos Roberto de Oliveira, um militar que havia entrado no voo de última hora, que precisava retornar a São Paulo. O terceiro ocupante, e último a ter o corpo reconhecido, era o mais famoso de todos: José Carlos Pace.
Os três voltavam de uma fazenda em Araraquara (SP) e caíram pouco antes da aproximação no Campo de Marte. Pace estava descansando no interior junto com amigos, entre os quais Emerson Fittipaldi. O choro desenfreado de Emerson no velório desmentia os boatos, fabricados por setores da imprensa, de que os dois brasileiros seriam rivais ferrenhos fora das pistas.
De todos os pilotos brasileiros que chegaram à F-1, Pace é o ídolo mais improvável. Tem apenas uma vitória na categoria. Em seu melhor momento, foi o segundo piloto de um argentino. Em seu último GP do Brasil, abandonou a prova depois de rodar enquanto liderava em Interlagos. Enquanto Emerson era bicampeão (e criticado quando era vice), a melhor colocação de Pace em um mundial foi a sexta, em 1975.
Um retrospecto assim jamais seria perdoado pela torcida no futuro —como aconteceu, por exemplo, com Rubens Barrichello. Por quê?
Em primeiro lugar, porque Pace não era um desconhecido para o público brasileiro. Nos anos 1960, o automobilismo nacional vicejava com o apoio de fábricas em diversas competições. A F-1 estava distante, a TV era um artigo de luxo, e as arquibancadas de Interlagos (e corridas de rua, sobretudo, em todo o Brasil) se enchiam para assistir a Luiz Pereira Bueno, Bird Clemente, Wilsinho Fittipaldi e tantos outros. Emerson e Pace eram os mais jovens daquela geração.
Moco, como era conhecido, correu pela Dacon e Willys nas provas de longa duração e, quando os monopostos começaram a ganhar destaque, no final da década, foi um dos destaques na Fórmula Vê. Venceu corridas e campeonatos por onde passou. A pecha de perdedor já não colaria mais.
CORAÇÃO GRANDE
Além disso, os colegas de Pace são unânimes em apontar seu espírito abnegado. Tinha uma predisposição natural a ajudar quem quer que fosse. Dava carona para amigos que encontrava ao acaso, emprestava o carro de passeio a jornalistas brasileiros no exterior e ajudava um sem-número de pilotos a correr na Europa, de Lian Duarte a Alex Dias Ribeiro. E, acima de tudo, era uma figura carismática. A apoteose da vitória no GP Brasil de 1975 ficou marcada no imaginário da época, apesar de ter sido o único triunfo na F-1.
Mas nada disso ajudaria Moco se ele não fosse rápido —e isso ele era. Em seu primeiro ano na F-1, em uma equipe pequena e desorganizada comandada por Frank Williams, conseguiu marcar pontos em duas provas.
Em 1973, mudou-se para a equipe que John Surtees havia montado pouco antes. Mesmo estando longe da ponta, impressionou em sua atuação em Nürburgring. Foi o quarto colocado e marcou a melhor volta. Na época, quem andava rápido no Nordschleife e ainda vivia para contar história ganhava o respeito quase automático do paddock.
Pace cometeu erros, como rodar na liderança em um GP Brasil. O importante é que foram perdoados. Hoje, o autódromo onde Moco sofreu o triste abandono leva seu nome em homenagem.
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