São Paulo não precisa de um autódromo como o de Abu Dhabi

Por Daniel Médici
Reta dos boxes de Interlagos, pouco antes do GP Brasil de 2016 (Daniel Médici/Folhapress)

Não é novidade que o prefeito de São Paulo, João Doria, visitou o autódromo de Yas Marina, em Abu Dhabi, na semana passada, durante seu tour no Oriente Médio para atrair a atenção de investidores dispostos a participar de seu plano de privatizações, que inclui Interlagos.

Apesar do interesse midiático, a visita deixou muitas questões sem resposta. Se, como este blog já havia afirmado, Yas Marina é um empreendimento estatal, e se Interlagos dá lucro, qual seria a viabilidade e o interesse para a cidade em privatizar o local?

Segundo a reportagem da Folha, Doria respondeu que a solução para São Paulo seria “seguir os modelos de eficiência do autódromo, que é cobrado pelo governo para que o investimento seja rentável”. Foi igualmente vago ao dizer que quer buscaria a “tropicalização” do modelo.

Não duvido que Yas Marina seja mesmo impressionante, mas, a partir do momento em que os carros entram na pista, Interlagos apresenta vantagens consideráveis. A começar pela visão da pista, em praticamente qualquer setor da arquibancada, que chega a 70% ou 80% do traçado. Os torcedores em Abu Dhabi, confortavelmente instalados sob ar-condicionado, atrás das enormes áreas de escape, não têm a mesma sorte.

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Sobretudo, Interlagos tem um ativo difícil de ser obtido, e que poderia ser melhor explorado: tem história. Foi um dos berços do automobilismo nacional e sul-americano. Passaram por lá Fangio, Chico Landi, Bird Clemente e Fittipaldi, isso antes de chegar a F-1. Qualquer grande expoente internacional do automobilismo ainda vivo tem algum bom depoimento para dar sobre o autódromo. Qualquer fã do planeta consegue reconhecer o traçado.

Como qualquer prova de F-1 minimamente saudável do ponto de vista financeiro, Yas Marina depende de um pesado investimento do poder público para fechar as contas.

O autódromo de Yas Marina é um sucesso por causa dos aportes estatais que criaram uma praça desportiva, um centro de entretenimento e um punhado de prédios de arquitetura faraônica. Nada muito diferente de Orlando ou Las Vegas. E a F-1 funciona como o grande outdoor para que o mundo conheça um emirado cuja existência era solenemente ignorada algumas décadas atrás.

São Paulo, e o Brasil, em geral, têm necessidades distintas das de Abu Dhabi. Não são ignorados pelo resto do mundo. Precisam, sim, de um autódromo seguro, que sirva de suporte para o esporte a motor local e internacional, mesmo que este divida o espaço com shows e eventos corporativos, como já o fazem pelo menos desde a gestão anterior. No fundo, São Paulo não precisa de uma Yas Marina, pois já dispõe de uma pista muito melhor.

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