Fittipaldi tem o mérito de não mentir sobre sua carreira em propaganda da Prefeitura de SP

Por Daniel Médici
Emerson Fittipaldi, da Lotus, em 1973 (Acervo UH/Folhapress)
Emerson Fittipaldi, da Lotus, em 1973 (Acervo UH/Folhapress)

“Nas minhas corridas, a segurança sempre esteve em primeiro lugar”, diz Emerson Fittipaldi, na propaganda da Prefeitura de São Paulo sobre o aumento das velocidades nas marginais. A notícia de que o piloto participa da peça foi veiculada pela Folha e contribuiu para inflamar o debate de uma medida já polêmica.

Sem entrar no mérito da “readequação” (nas palavras da própria propaganda) que deve entrar em vigor nesta quarta (25), a fala do ex-piloto tem ao menos um ponto digno de destaque: Emerson não está mentindo sobre sua carreira.

Entre os campeões brasileiros de F-1, Fittipaldi é, de longe, o que se mostrou mais leal dentro das pistas. Nenhum de seus adversários jamais reclamou de ter sido fechado ou ter sua integridade posta em risco em uma disputa com ele. O mesmo não pode ser dito em relação a Piquet e Senna.

Ambos os tricampeões brasileiros, em especial no início da carreira, tinham certa fama de temerários entre os colegas. Eram poucos os que se arriscavam a ultrapassar Piquet com a certeza de que não levaria uma fechada. Quanto a Senna, as disputas de posição em seus tempos de Lotus já são famosas o bastante (o GP da Europa de 1985 é um bom exemplo). Com o tempo e a experiência, as reclamações dos adversários cessaram —e não é verdade que o acidente que matou Senna esteja relacionado à sua agressividade ou a um erro do próprio.

Fittipaldi, por outro lado, era famoso pela limpeza de suas manobras. Não à toa, sempre foi amigo do seu grande adversário na F-1, Jackie Stewart. Em uma situação de ultrapassagem, os rivais nutriam a confiança mútua de que sempre haveria espaço para os dois carros na curva seguinte, mesmo que isso custasse a posição de quem estivesse à frente. Nos anos 1970, em que muitas vezes dois ou três corredores morriam em uma única temporada, a lealdade era uma característica muito mais valorizada.

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Assim como Stewart, Emerson foi uma das grandes vozes que lutaram por mais segurança no esporte a motor. No GP da Espanha de 1975, os pilotos se deram conta de que o circuito de rua de Montjuïc não tinha condições mínimas para receber uma prova. Sob ameaça de represálias dos organizadores, Fittipaldi foi o único que se recusou a largar. Demorou menos de uma hora para provar que tinha razão: um acidente com Rolf Stommelen na volta 26 deixou cinco espectadores mortos e uma dezena de feridos, incluindo o alemão da Embassy Hill, com fraturas múltiplas. A F-1 nunca mais correu em Montjuïc.

Dito isso, parece no mínimo infeliz a ideia de se usar um ex-piloto em uma peça publicitária sobre aumento da velocidade no trânsito. Ao contrário do automobilismo, andar de carro não é um esporte.

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