Últimos fãs do GP Brasil ainda acampam em frente aos portões antes de todas as corridas

Por Daniel Médici
Sem fila, torcedores do setor A entram no autódromo por volta das 8h da manhã (Daniel Médici/Arquivo pessoal)
Sem fila, torcedores do setor A entram no autódromo por volta das 8h da manhã (Daniel Médici/Arquivo pessoal)

Quando vim para Interlagos pela primeira vez, em 2003, como torcedor, comprei ingresso para o setor A, na reta dos Boxes. Cheguei às 3h da madrugada na fila, que estava a meio caminho entre a ponte sobre o Jurubatuba e a entrada do portão. A largada seria apenas às 14h.

Era uma cena comum até pouco mais de meia década atrás: os torcedores mais fervorosos passavam a madrugada inteira a postos para conseguir o melhor lugar na arquibancada de alvenaria, sem cobertura, sem luxo algum.

Neste sábado (12), às 21h, não mais do que 20 pessoas acampavam no mesmo local. Um dos grupos trouxe cadeiras de praia, churrasqueira, mesas de plástico e compraram dois barris de chope. Estavam abrigados em três barracas com armação de alumínio para se protegerem da chuva fraca, que não deu trégua durante toda a noite.

A maioria assiste ao GP Brasil das arquibancadas há mais de dez anos. Quase nenhum deles se conheceu fora do autódromo.

“Venho aqui desde 2000. Sempre trouxe uma lona para me cobrir de madrugada. Um dia, conheci um cara que trazia cadeiras de praia e acabamos unindo forças”, diz Valdir Agnoletto, que vem de Curitiba todos os anos para assistir à prova. O “cara das cadeiras” estava a seu lado enquanto contava a história.

A lona não é mais necessária, já que um colega de Campinas, detentor das barracas, se juntou ao grupo há pouco mais de cinco anos. As tralhas ficam guardadas nos carros ou em casas próximas alugadas.

A montagem do acampamento tem início logo depois do treino de classificação, no sábado. Alguns anos antes, o grupo nem esperava o fim do Q3 —já saía do autódromo antes da multidão para não bobear. Hoje, não é mais necessário.

Já há alguns GPs a improvisação deu lugar a um planejamento mais estrito do grupo. Altemir Gonçalves, com sua inconfundível camiseta que homenageia Michael Schumacher, é o braço financeiro. Ivonildo Ivo, que traz as facas, espetos e grelhas, vai comprar as carnes assim que possível. Às 19h de sábado, a churrasqueira já está acesa.

Ao longo da noite, capas de chuva estendidas na calçada viram camas improvisadas para um cochilo. Os banheiros químicos da praça Enzo Ferrari, onde fica uma base da PM, e padaria da av. Interlagos servem como posto de apoio. Por volta das 5h da manhã, toda a tralha é recolhida e o grupo espera a abertura dos portões. Às 7h, quando as catracas são ligadas, raramente a fila se estende por mais de 100 metros.

Apesar de terem trazido uma faixa de agradecimento a Felipe Massa, os campistas asseguram: não importa se tem brasileiro na pista ou não —enquanto houver GP Brasil, eles estarão na fila.

“Nós estamos aqui todos os anos e nenhum piloto brasileiro nunca parou pra nos cumprimentar. Mas nós continuamos vindo”, desabafa Altemir.

“Olha a minha camiseta, olha o meu boné”, diz Valdir, apontando os traçados de Interlagos desenhados nas peças. “Não torço para equipe nenhuma, piloto nenhum. Eu torço é para o GP.”