Max Verstappen e Nico Rosberg se aproximam do grampo ao final da grande reta. Rosberg atrasa a freada ao máximo, gira o volante à direita pouco antes da linha branca que delimita a pista. Verstappen, do lado de fora faz o contorno pela área de escape (asfaltada, claro). Nico ganha a posição.
Seria uma das melhores manobras do GP da Alemanha, caso ela não tivesse rendido uma punição ao piloto da Mercedes. Mal o replay havia sido mostrado na transmissão, uma gravação de rádio já mostrava Verstappen reclamando de um bloqueio do adversário. Antes de os dois completarem a volta, um aviso atestava que o “incidente” estava sob investigação. Pouco depois, Rosberg era condenado a pagar cinco segundos de punição durante o pit stop. A Mercedes se atrapalhou e Nico terminou em quarto lugar uma prova em que poderia ter chegado em segundo.
Com o perigo que é peculiar às corridas de automóvel, é natural e desejável que haja um código de ética em manobras perigosas, como as ultrapassagens —não mudar de direção duas vezes, por exemplo. Ocasionalmente, porém, parece que a direção de prova, a cargo de Charlie Whiting, abusa da prerrogativa de arbitrar sobre ultrapassagens na Fórmula 1. E o pior: sem critério aparente.
No GP anterior, na Hungria, o próprio Verstappen foi acusado por Raikkonen de bloquear uma tentativa de ultrapassagem. A direção de prova sequer colocou o caso sob investigação.
O comando da torre de controle parece ter sido abatido pela síndrome de ginástica olímpica, ou salto ornamental, ou qualquer outro esporte onde os atletas são classificados por notas de um comitê julgador.
A categoria, há mais de uma década tentando solucionar a escassez de ultrapassagens com artifícios variados —kers, asa móvel, zonas de utilização de asa móvel, uso obrigatório de mais de um tipo de pneu por GP— não parece muito empenhada em estimular os pilotos a arriscar mudanças de posição em pista. Não é de se estranhar, portanto, que a F-1 continue perdendo fãs, apesar de toda a pirotecnia.
Dito isto, a punição a Rosberg não é desculpa para a sua péssima largada (a segunda consecutiva, aliás!) e a liderança cada vez mais isolada de Hamilton na tabela. Nico tem um carro campeão e um sobrenome campeão, mas ainda não provou que tem o necessário para ser campeão. O piloto afobado e inconstante que ele foi nas últimas duas provas está condenado, mais uma vez, à segunda colocação no campeonato. Por sorte, o próximo GP, na Bélgica, só acontece no fim de agosto. O alemão leva muita lição de casa para as férias.
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A história se repete como farsa, eis a prova. Há 25 anos, também em um GP da Alemanha, Senna e Prost travaram disputa semelhante. Na época, Hockenheim era uma sequência infernal de retas a perder de vista, separadas por chicanes não muito seguras —muito diferente do traçado insosso atual.
Nas últimas voltas, Prost pegou o vácuo do rival e tentou abrir por fora na primeira chicane. Ayrton atrasou a freada o quanto pôde, deixando para o francês a parte suja da pista. A Ferrari terminou rodando na área de escape (asfaltada, por acaso).
Prost vociferou ao final da prova, afirmou ter sido bloqueado, avaliou a manobra do brasileiro como “não muito correta”. Senna devolveu: “Todo mundo já conhece o Prost a essa altura, ele está sempre reclamando que é o carro, ou os pneus ou a equipe, ou os mecânicos, ou o combustível, ou os outros pilotos, ou a pista. É sempre culpa dos outros, nunca dele”.
Ainda de cabeça quente, o francês retrucou com uma ameaça: “Não tenho nada a perder, não posso mais vencer o campeonato, mas se eu o encontrar de novo na pista nas mesmas condições, eu o jogo pra fora”.
A declaração pegou mal e ambos foram convidados se reunir num motorhome e encenar uma reconciliação. Prost não jogou Senna pra fora e o brasileiro foi campeão naquele ano. Com tantos outros encontros explosivos em pista na carreira, o episódio de Hockenheim em 1991 foi solenemente esquecido pelo grande público. É de se questionar quantas posições no grid os dois iriam perder por prova se pilotassem hoje em dia.