Talvez seja novidade para os mais jovens, mas, até 1990, nem todas as corridas de um piloto contavam para a pontuação final na Fórmula 1. Naquele ano, apenas os 11 melhores resultados eram válidos para o campeonato, e o restante, se houvesse, era descartado.
O sistema de descartes existia, até então, desde a primeira temporada, em 1950 e, na maior parte do tempo, não alterou significativamente a tabela —até porque o índice de abandonos era enorme comparado aos de hoje em dia, mesmo para os melhores carros do grid.
Apenas em dois anos o campeão teria sido diferente, caso os descartes fossem suspensos retroativamente: em 1964, com Graham Hill coroado no lugar de John Surtees, e em 1988, com Alain Prost no lugar de Ayrton Senna.
A palavra-chave aqui é “retroativamente”: porque não dá pra desmerecer um piloto que jogou de acordo com as regras estabelecidas antes de o campeonato começar.
Até porque os descartes cumpriam uma função bastante defensável, que era valorizar a vitória em detrimento à regularidade. Isso se reflete bem no caso de 1988: Senna marcou 94 pontos nas 16 corridas, 90 dos quais valeram; enquanto Prost fez 105 pontos, 87 deles válidos. Mas Prost venceu sete corridas no ano, enquanto o brasileiro conquistou oito, até então um recorde.
Caso não existissem descartes, o ano de 88 seria o terceiro consecutivo em que o piloto com o maior número de vitórias não levaria o título. Em um caso extremo, Nelson Piquet foi tricampeão em 1987 com três vitórias, enquanto Nigel Mansell, vice, ganhou o dobro de GPs. E não dá pra dizer que foi injustiça: era a regra vigente.
No total, mesmo com a regra dos descartes, seis dos dez campeonatos dos anos 80 não tiveram como campeão o piloto com mais vitórias.
Nas categorias americanas, como Nascar e Indy, isso até acontece com certa frequência, já que os sistemas de pontuação privilegiam a regularidade, apelando para que o campeão seja definido na última corrida. Isso já provocou algumas bizarrices: por exemplo, o espanhol Oriol Servià foi campeão da Indy Lights em 1999 sem ter obtido uma única vitória.
Atualmente, faria sentido a Fórmula 1 reconsiderar os descartes não para valorizar a vitória, mas por um efeito colateral: desde que a pontuação para o primeiro lugar saltou de 10 para 25, abandonar uma corrida significa afundar na tabela, para um favorito. Isso pode inibir a inovação das equipes nos projetos e limitar a disputa. E se a Ferrari se encontrar até a metade do campeonato? Muito dificilmente Vettel será um postulante ao título. Faz mais sentido os italianos já apostarem parte de suas fichas em 2017, o que cria um círculo vicioso de uma equipe ultradominante para cada campeonato.
Se abandonos pudessem ser desconsiderados, a tendência, teoricamente, é que os pilotos também arriscassem mais por uma vitória, eliminando entraves para corridas mais disputadas. Será que essa ideia não valeria uma boa consideração?