Não era lá uma novidade que Emerson Fittipaldi e suas empresas estavam sendo cobrados na Justiça por dívidas não pagas, mas o caso ganhou evidência nesta semana.
Boa parte dos problemas começaram com organização da etapa brasileira do Mundial de Endurance (WEC, na sigla em inglês), entre 2012 e 2014, da qual o ex-piloto foi promotor.
No último domingo, entretanto, foi ao ar na TV Record uma reportagem sobre o imbróglio, com imagens pra lá de simbólicas: troféus e carros usados por Emerson em sua carreira e que ele conservava, como um Copersucar FD04 e um Penske-Patrick sendo rebocados para futura penhora.
A cena me lembrou do dia em que vi aquele mesmo Copersucar, no escritório do Emerson, enquanto esperava o próprio piloto para entrevistá-lo.
A ideia de fundar uma equipe brasileira e colocá-la para correr na Fórmula 1 era ambiciosa, e o orçamento, mesmo nos anos 70, quando a categoria era movida a cifras muito mais modestas, nunca foi compatível com a das concorrentes europeias.
Ao entrar para a equipe, em 1976, Emerson sabia que superar os rivais na pista seria quase tão difícil de convencer a opinião pública brasileira do gigantismo do projeto.
“Acho que, na época, o Copersucar-Fittipaldi foi um projeto avançado demais para o Brasil, que ainda não conhecia a F-1”, ele disse, naquela entrevista.
“Em 1973, eu fui vice-campeão com a Lotus. Lembro que, quando cheguei no Brasil, um jornalista perguntou: ‘Emerson, o que aconteceu? Você chegou só em segundo?’ [e deu uma risada]. Aí eu disse: ‘Olha, foi um ano difícil…’” —Emerson já havia sido campeão mundial em 1972.
Em 1980, a equipe Fittipaldi (assim renomeada, já que a Copersucar havia abandonado o barco) contava com um quadro de funcionários promissor. O engenheiro era Harvey Postlethwaite, que venceria campeonatos de construtores pela Ferrari. Seu assistente era um tal de Adrian Newey, muito jovem, recém-saído do Imperial College. Parece até que ele se deu muito bem na carreira, depois disso…
O companheiro de Emerson era o futuro campeão Keke Rosberg.
Naquele ano, a equipe subiu duas vezes ao pódio. Mesmo assim, no meio da temporada, a Skol, principal patrocinadora, anunciou que não renovaria seu contrato. A explicação: a equipe havia virado motivo de chacota no Brasil, pela falta de vitórias, e a marca perdeu o interesse em associar sua imagem à dela.
Após dois anos e um doloroso declínio, a Fittipaldi finalmente fechou as portas, e Emerson se viu numa situação muito parecida com a atual, com dívidas exorbitantes em suas mãos. Nunca mais outra equipe brasileira competiu no certame.
A solução que ele tomou já é bastante conhecida: tirou o capacete do armário, foi correr nos EUA e foi muito bem-sucedido, outra vez. Venceu um campeonato da Indy e duas edições das 500 Milhas de Indianápolis. Foi o primeiro brasileiro a alcançar tal feito, e o primeiro estrangeiro a vencer a prova em mais de 20 anos.
O mesmo país que transformou o bicampeão da F-1 em símbolo de fracasso por causa de sua equipe aprendeu, afinal, a respeitá-lo. Hoje, é ponto pacífco que o automobilismo brasileiro teria muito menos troféus na estante, não fosse por ele.
Isso, é claro, não deve servir de foro privilegiado para ninguém: o lugar de Emerson no panteão do esporte já está garantido. Como empresário, no entanto, cabe à Justiça decidir seu legado.